18 de dez. de 2011

Perseguição da fé dos outros é refresco ou incentivo?

Há algumas semanas recebi um e-mail do Rev. Osni Ferreira, missionário Presbiteriano, informando sobre a situação do pastor Youcef Nadarkhani, preso no Irã e condenado à morte por abandonar o islamismo e se converter à fé cristã. Desde então, tenho levado informações referentes ao pastor Youcef à igreja e convocado os irmãos a orar em favor daquele pastor. No Brasil inteiro, várias igrejas se mobilizaram em oração, e ao redor do mundo, houve uma grande pressão em favor da libertação do pastor e da suspensão da pena de morte.

Na última semana, um novo e-mail que recebi do Rev. Osni informava a respeito da suspensão da pena de execução. A reação não poderia ser outra a não ser de alívio e gratidão a Deus pelo livramento concedido ao seu servo.

Ficou claro pelas informações repassadas a respeito do caso do pastor Youcef que ele não abriria mão da sua fé em hipótese alguma. O risco de ser executado não foi suficiente para fazê-lo abandonar a sua crença em Cristo. Sua firmeza e coragem serviram de exemplo a crentes do mundo inteiro, trazendo à memória as lembranças de outros grandes servos de Deus que não se intimidaram com ameaças e mantiveram firmes a esperança da vida eterna. Alguns desses servos acabaram mortos, e entraram para a galeria dos mártires e seu sangue, como afirmou Tertuliano, se tornou “a semente de novos cristãos”.

No entanto, há algo mais a ser considerado a respeito da situação do pastor Youcef Nadarkhani. A comoção de muitos crentes brasileiros, infelizmente, não significará nada daqui a alguns meses. Quando a poeira baixar, quando os noticiários e informações pela internet diminuírem, e o nome Youcef Nadarkhani desaparecer da chamada “memória declarativa” dos nossos crentes, pouca diferença terá feito toda a comoção hodierna em torno do fato.

A grande verdade é que é muito fácil ficarmos comovidos com a perseguição de crentes que estão distantes de nós, sofrendo torturas ou ameaças de morte em países muçulmanos ou comunistas. É fácil incentivar vigílias de oração, promover passeatas e outras mobilizações virtuais, e até mesmo elogiar a fé de quem está a milhares de quilômetros padecendo por ser crente. Difícil é entender que a situação de homens como Youcef Nadarkhani não é extraordinária no contexto cristão. Na verdade é o padrão, a regra, não a exceção para os que se declaram verdadeiros servos de Cristo e querem viver de maneira relevante a sua fé.

O apóstolo Paulo afirmou: “Ora, todos quantos querem viver piedosamente em Cristo Jesus, serão perseguidos” (2 Tm 3. 12). Estaria o apóstolo se referindo apenas à sua época ou especificamente a contextos de perseguição oficial ao cristianismo? Ou seria este um princípio universal e atemporal?

É preciso entender que Paulo não se refere apenas às perseguições armadas e ameaças evidentes de morte. O apóstolo tem em mente todo tipo de desafio imposto àqueles que desejam viver piedosamente. Estes, nas palavras de William Hendriksen, são os que “fizeram uma resolução séria, com a ajuda e a graça de Deus, de viver uma vida de devoção a Cristo. Eles vivem em íntima comunhão com ele”. Hendriksen ainda diz que “a experiência de Paulo não é, de nenhum modo, peculiar. As cicatrizes são o preço que todo crente paga por sua lealdade a Cristo. Estas são também suas credenciais diante de Deus”. Portanto, ser perseguido por causa da fé em Cristo é a regra, não a exceção para os verdadeiros crentes.

As perseguições contra a fé cristã podem ser de diversas naturezas. No caso do pastor Youcef é de natureza governamental e religiosa. Mas há ainda as perseguições ideológicas, culturais, morais e tantas outras que qualquer crente piedoso pode sofrer em qualquer lugar do mundo, inclusive no Brasil, que é considerado um país livre. João Calvino diz que “Satanás possui mais de um método de perseguir os servos de Cristo. Mas é absolutamente necessário que todos eles suportem a hostilidade do mundo, de um modo ou de outro, a fim de que sua fé se exercite e sua constância se comprove. Satanás, que é o perpétuo inimigo de Cristo, jamais deixará que alguém viva sua vida sem algum distúrbio, e haverá sempre pessoas perversas a espinhar nossas ilhargas. De fato, tão pronto um crente mostre sinais de zelo por Deus, a ira de todos os ímpios se acende e, mesmo que não tenham suas espadas desembainhadas, arrojam seu veneno, ou criticando, ou caluniando, ou provocando distúrbio de um ou de outro modo”.

Elogiar a firmeza do pastor Youcef Nadarkhani é muito fácil. Orar por ele também é. Mas precisamos ir além dessa comoção momentânea e compreender os desafios que temos como crentes em nosso país, em nossas cidades, em nossos próprios contextos. É preciso entender que a mesma fidelidade demonstrada pelo pastor Youcef diante dos tribunais iranianos se espera de nós, crentes brasileiros, diante das pressões da cultura pecaminosa em que vivemos, diante das pressões do pluralismo religioso, do liberalismo teológico, do relativismo cultural, da tolerância à imoralidade, do convite à corrupção, entre outras ameaças tão graves quanto as sofridas pelo pastor iraniano. É urgente que entendamos o que Paulo disse a Timóteo, que todos que quiserem viver piedosamente em Cristo, seja onde e quando for, estarão sujeitos a sofrer perseguições. “Ainda que não sofram os mesmos ataques e não se envolvam nas mesmas batalhas, eles têm uma só guerra em comum e jamais viverão totalmente em paz isentos de perseguição”, diz Calvino.

A perseguição da fé de homens como Youcef Nadarkhani pode ser um bom refresco para crentes displicentes e despreocupados com a qualidade do seu compromisso com Cristo. Mas será um poderoso combustível aos que desejam levar a sua experiência com Deus a sério, e um incentivo a se tornarem ainda mais fervorosos. Afinal, se a perseguição é “um ingrediente inescapável da vocação cristã”, como afirmou o comentarista bíblico John Kelly, nenhum verdadeiro crente deveria se considerar isento de sofrê-la, a qualquer momento e em qualquer lugar.

Por: Agnaldo Silva Mariano

Com informações do: Creio e confesso

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